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Inhotim, uma trajetória

Redação Inhotim

A pequena casa onde está instalada a obra de Rivane Neuenschwander é um mundo de lembranças para Tamara Oliveira. Quando entra ali, ela volta no ano de 2007 e revive os encontros semanais de quando integrava o Laboratório Inhotim, um dos projetos educativos mais antigos do Instituto.  De lá pra cá, a casa que era parte da antiga fazenda foi transformada para abrigar uma obra de arte.  “Eu volto e consigo ver as paredes, a escada, o fogão a lenha, como era quando tudo começou”, conta.  Aos 21 anos, Tamara cursa o 3º período de Psicologia e, desde 2013,  é mediadora do mesmo programa que participou quando criança. “O Inhotim faz parte do meu passado, e é também o meu presente”, diz.

Indicada por um professor de Geografia para participar do projeto aos 14 anos, Tamara aceitou mesmo sem saber muitos detalhes do que seria feito durante o semestre. “Eu conheci o Inhotim com a minha escola nesse mesmo ano, e me encantei. Quando recebi o convite para integrar o Laboratório, aceitei na hora”. A proposta dos encontros era a mesma que guia o projeto até os dias de hoje: explorar o parque com liberdade e sensibilidade para estimular um olhar crítico sobre Brumadinho e o mundo.  Com o fim dos dois módulos do projeto, Tamara tornou-se bolsista do Instituto, fazendo do Inhotim parte do seu dia a dia por mais dois anos.

O encontro com grandes artistas está entre as melhores lembranças da jovem, assim como a chance de ver o Inhotim crescer e se transformar ao longo desse tempo. “Me lembro do dia em que fomos com Jarbas Lopes e os fusquinhas para Brumadinho, e fizemos intervenções na cidade. Me lembro também do encontro com Chris Burden e de ver o Beam Drop nascendo” relembra. Durante todos esses anos, Tamara conseguiu ir longe. Foi  selecionada em um edital do Congresso Nacional da Federação  de Arte/Educadores (Confaeb) em São Luis do Maranhão,  onde apresentou a pesquisa desenvolvida ao longo do programa e ainda saiu do país pela primeira vez rumo à  Londres, junto ao Laboratório. Na viagem, ela conheceu de perto jovens integrantes de projetos parecidos da Tate, Museu de Arte Moderna do Reino Unido, após um ano de troca de experiências à distância. ” Além de tudo, era um sonho conhecer um país que fosse monarquia”, conta.

Com o fim da bolsa, surgiu a oportunidade do primeiro emprego como mediadora. Chegou a hora de viver o outro lado do Laboratório Inhotim . “Eu fico reparando neles e me vejo ali, com aquele medo do novo típico. É o primeiro encontro com a arte e cada um tem seu tempo. Eu procuro entender e respeitar isso”. Segundo a estudante, é difícil para um adolescente mensurar a dimensão dessa oportunidade. “O que eu vejo de especial nesse trabalho é que ele oferece um monte de possibilidades de olhares, mostra que tudo depende do ponto de vista. Muitas vezes só percebemos quão importante foi essa chance depois que saímos e crescemos”, avalia. Como mediadora, os dias são imprevisíveis e surpreendentes. “Acontece muito da gente planejar  toda uma dinâmica para o grupo e vem algum jovem com uma ideia nova e muda o rumo de tudo. Isso é fantástico”, diz.

Os dias no parque influenciaram em importantes decisões de Tamara, que sonha em continuar trabalhando na área de educação. Decidida a se dedicar mais à faculdade, ela reconhece a necessidade de deixar os trabalhos no Inhotim em breve, mas considera impossível a possibilidade de se distanciar de tudo que experimentou no Instituto. “Não tem como sair e deixar para trás o que passei aqui. Eu vou levar o Inhotim comigo pela vida, porque, depois de tantos anos, eu ainda consigo me surpreender com esse lugar”.

 

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Inhotim: um lugar de descobertas

Redação Inhotim

Nada de carteiras enfileiradas, tarefa para copiar do quadro ou hora certa de fazer perguntas. Ao redor, microscópios, lupas e espécies vegetais desconhecidas. Estamos no Espaço Ciência: um lugar de educação não formal. Aqui, não há limites para a curiosidade.

Se você olhar pra trás, provavelmente vai concordar que as experiências mais marcantes da sua vida escolar foram inusitadas, irreverentes ou curiosas. Desde a criação do projeto Espaço Ciência Itinerante, em 2012, mais de 16 mil alunos entre 6 e 14 anos da rede pública de ensino de Minas Gerais já passaram por momentos como esses e aprenderam sobre ciência e educação ambiental colocando a mão na massa.

Os alunos da rede pública de Casa Branca (MG) já participaram do projeto. Foto: Rossana Magri.
Os alunos da rede pública de Casa Branca (MG) já participaram do projeto. Foto: Rossana Magri.

Funciona assim: primeiro, os educadores do Instituto passam dois dias na escola. É o momento de apresentar a parte teórica. Mas, nesse projeto, não há lugar para a monotonia. Com a ajuda de biorréplicas e instrumentos científicos, as crianças já começam a se familiarizar com o trabalho de campo.

Em seguida, é hora de partir para o Inhotim. Entrar no parque é experimentar um novo mundo. As mais de 5 mil espécies da coleção do Jardim Botânico Inhotim representam 28% das famílias botânicas conhecidas do planeta. A disposição das plantas em um projeto paisagístico que não existe em nenhum outro lugar do mundo encanta visitantes de todas as idades. Deu pra imaginar o quanto esse momento é especial para os pequenos exploradores? Assista ao vídeo:

Saindo do parque, os alunos já se tornaram jovens educadores. Stéphany Keroly, 9 anos, conta o que descobriu:

“Eu aprendi que não devemos desmatar a natureza e que os animais precisam da sombra da árvore. Aprendi também que através das folhas é que as árvores respiram o ar sujo e liberam o ar limpo. As árvores são cheias de canudos e que, quando são cortadas, a cidade fica desmatada. Já o cocô da minhoca é muito nutritivo para as plantas.”

Núbia Silva, também com 9 anos, alerta:

“Não devemos maltratar as plantas porque até os animais cuidam delas, então, devemos cuidar também. Não cuidar dos rios causa erosão, deslizamento e pode acabar matando a gente.”

Foto: Daniela Paoliello
Foto: Daniela Paoliello.

Deu vontade de voltar à infância? Não se preocupe. Em algumas ocasiões do ano, o Espaço Ciência é oferecido também para os visitantes do Inhotim, como parte da programação gratuita do parque. É só ficar atento ao calendário quando for agendar a sua próxima visita.

Em 2014, o projeto Espaço Ciência contou com o patrocínio da Vale por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura.

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O início de uma mudança

Maria Eugênia Salcedo Repolês

 

Traçar o início de uma mudança é difícil. Começa quando temos a ideia? Quando a ideia toma forma ou quando mais pessoas partilham da mesma?

 

Podemos dizer que tudo começou no último 23 de agosto, dia no qual aconteceu no Teatro do Inhotim um encontro para entender os bastidores do trabalho de programação cultural. Na ocasião, o principal convidado foi Álvaro Restrepo, fundador e representante do incrível Colégio Del Cuerpo em Cartagena, Colômbia. O principal objetivo do encontro era o de criar um momento de reflexão sobre programação, curadoria e cultura, para que os jovens ligados aos programas socioeducativos do Inhotim pudessem tirar dúvidas e se preparar para as suas práticas propositivas. Os outros convidados? Músicos e artistas da cidade de Brumadinho e Belo Horizonte, jovens da cidade, funcionários do Inhotim. Estávamos todos cada vez mais unidos pelas palavras do coreógrafo e dançarino colombiano.

 

“O corpo é o nosso tempo.” Disse Restrepo, e complementou com uma observação sobre sua visita ao Inhotim: “Um lugar como este nos ajuda a sentir o tempo, ou seja, nos ajuda a sentir o nosso corpo. Temos que vir e dedicar tempo a esta experiência.”

Álvaro Restrepo LEGENDA. Foto: Daniela Paoliello.
Álvaro Restrepo no Seminário de Programação Cultural do Inhotim. Foto: Daniela Paoliello.

 

Na sequência, falou sobre sua proposta política e cultural de uma espécie de “supra-ministério” para a paz. Nesta proposta, a cultura assume um papel central aliado a economia, comunicação, saúde, meio ambiente e educação. “Objetiva-se uma educação para a sensibilidade. Devemos mudar o imaginário de como somos e como podemos criar relações entre pessoas.”

 

No momento desta fala, olhei ao meu redor no teatro. Jovens de Brumadinho ouviam Álvaro relatar detalhes da experiência em Cartagena, na rua, em vários cantos da Colômbia, nas salas de aula. Percebo que alguns não usam o aparelho da tradução simultânea. A princípio, me preocupo que talvez estes que optaram por não ouvir a tradução, possam não estar entendendo tudo. Rapidamente, reparo que estão tão imersos quanto eu no relato desta experiência que tem mobilizado aproximadamente 8 mil crianças durante 17 anos. Vejo os jovens movidos, tocados, acordados pelo agito silencioso e coletivo que invade o Teatro do Inhotim. Estamos todos pensativos. Uma ideia prevalece em mim: estamos todos ouvindo detalhes sobre uma experiência exemplar de transformação, sendo que somos também participantes e testemunhas do nosso próprio processo de transformação pela educação. É por isso que havia uma certa união e cumplicidade dentre o público presente naquele dia. Artistas, jovens, funcionários do Inhotim, moradores da cidade. Conheço quase todas as pessoas presentes e os conheço porque a minha educação cotidiana se dá por meio de cada um deles. Somos responsáveis pela educação uns dos outros. Somos responsáveis pelas transformações diárias que acontecem e transformam o nosso ambiente.

 

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Os alunos do projeto Laboratório Inhotim agora também são programadores culturais. Foto: Daniela Paoliello.

 

Álvaro Restrepo falou de interdependência. De romper com a solidão do individualismo. Solidão que nos impede de compartilhar as nossas dores, mas que também nos priva de cerimônia ou comemorações coletivas. A solidão é uma violência que pode ser mudada. Ele fala de cultura e da dança como uma atitude, um aprendizado, uma forma de “esculpir o corpo individual e coletivo”. Nos ensina que “tocar é um aprendizado ético também”.

 

Finalmente, nos convoca a refletir sobre em qual momento da humanidade perdemos o sentido da conexão e integração com a paisagem e com a beleza. Precisamos recuperar o diálogo e os momentos de conexão. Rapidamente as perguntas e comentários se acumulam no público. Algumas pessoas já estão com o microfone nas mãos, outras fazem anotações, alguns jovens falam no meu ouvido: “Temos ideias para o festival de rua em Brumadinho!”.

 

Ouço o educador Eduardo Martins Cunha dizer ao microfone “…é na educação que podemos fazer a manutenção das nossas utopias.” Nesse momento ocorreu uma mudança em mim. Estava, assim como os jovens da cidade de Brumadinho, inspirada e desejosa para colocar as ideias em prática. O que podemos fazer junto com estes artistas e parceiros? Qual espaço da cidade melhor acolhe estas ideias? O que daremos conta de fazer até novembro? Não pode circular dinheiro no nosso evento! Vamos fazer atividades com o público similares às que fazemos em pesquisa no Inhotim. Queremos que haja um piquenique! Traçar o início de uma ação coletiva é difícil. Começa quando uma pessoa deseja mudança ou quando mais pessoas partilham do mesmo desejo?

 

Assim (re)nasceu o Laboratório Mambembe. A ideia é antiga, o planejamento por trás foi enorme e cheio de parceiros. Os propositores principais são os jovens moradores de Brumadinho e participantes de programas educativos do Inhotim. O corpo de cada um deles foi o primeiro lugar de se colocar as ideias em prática. O segundo, é a cidade de Brumadinho. Sei que este evento será, de uma maneira ou outra, o exercício de pequenas utopias escolhidas pelos jovens. Será também uma mudança no planejamento futuro de alguns dos programas educativos da instituição e, esperamos, um momento de mobilização do corpo coletivo da cidade de Brumadinho.

 

Estão todos convidados!

 

Laboratório Mambembe
Sábado, 1º de novembro
De 12h às 21h
Praça Antônio Carlos Cambraia
Brumadinho – MG

 

Saiba mais sobre o evento e leia o manifesto escrito pelos jovens propositores.

Conheça o trabalho fantástico do Colégio del Cuerpo.

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Beleza cotidiana

Rosalba Lopes

 

Até 28 de setembro, próximo domingo, o Inhotim participa da Primavera de Museus, evento nacional promovido pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), que, em 2014, traz o tema Museus Criativos. Entre as atrações da programação do Instituto, está a exposição Beleza Cotidiana, uma proposta de apresentar a relação que os brumadinenses estabelecem com o belo, convidando à reflexão sobre a sensibilidade humana e suas múltiplas manifestações.

 

Os laços afetivos e a vida cotidiana também são temas acessados pelas imagens que o fotógrafo Marcelo Coelho produziu com maestria, ao enquadrar as orquídeas cultivadas nas casas dos moradores do município. Nas narrativas que compõem a exposição, é possível perceber um pouco da subjetividade dos cidadãos deste município, cuja riqueza cultural se expressa no senso artístico de seus músicos, na religiosidade e ritmos marcantes das Guardas de Congado e Moçambique. Enfim, na manutenção de rituais que ainda fazem ver a herança rural sobrevivente nessa sociedade em rápida transição para os padrões urbanos que marcam o modo de vida contemporâneo.

 

Nas flores e frases, morte, memória, vida, celebração e a importância do cuidar se revelam em uma explosão de beleza, harmonicamente apresentada em projeto expográfico de Esther Mourão (Ticha). Temas e flores que também surgem do trabalho delicado das artesãs do Médio Vale do Paraopeba que, com seu fazer, descortinam uma primavera construída por mãos humanas, conforme se vê nos arranjos florais que compõem a exposição.

 

Beleza Cotidiana resulta, ainda, de um persistente trabalho de pesquisa realizado em Inhotim, com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre o território e, assim, propor ações que valorizem a identidade local. Somente no âmbito desse conjunto de pesquisas seria possível a escuta que nos coloca frente a interrogações como a de Ângela Magela, cultivadora de orquídeas em Brumadinho, ao questionar: “A beleza é insofismável, não é?”.

 

Convidamos você a mergulhar neste universo de beleza e sensibilidade.

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A Festa da Colheita em Brumadinho

Rosalba Lopes

Festa da Colheita é agradecimento pelos primeiros frutos, é celebração das primícias. Fala da prosperidade, do nascimento daquilo que foi semeado. Na longa tradição que acompanha a humanidade desde o domínio da agricultura, e particularmente, na tradição católica, ela ocorre ao final da safra e seu principal sentido é a oferenda. Na comunidade quilombola de Marinhos, em Brumadinho, o evento ocorreu no último domingo, 14/09.

 

Ao longo da celebração, os agricultores agradeceram pelo milho, abóbora, cana, feijão e até pela lenha produzida na comunidade, cujo grupo de roça – Quem planta e cria tem alegria – é expressão fiel do que se viu ao longo do dia. A comunidade cantou, festejou e comemorou. Tudo deliciosamente acompanhado pelo frango com ora-pro-nóbis. Antes que a produção chegasse às mesas das instituições para as quais foi doada, ela foi saudada pelo canto dos violeiros e pelo jogo de capoeira dos grupos locais. Foi também reverenciada pelas mulheres da comunidade, com sua dança da peneira. Coreografia que faz lembrar que os modos de fazer podem atravessar os séculos e sobreviver em rituais antes praticados em torno das fogueiras, hoje em torno da colheita, mas sempre sustentados pela noção de pertencimento.

Foto: Daniela Paoliello
Mulheres celebram os primeiros frutos da estação. Foto: Daniela Paoliello

Por fim, a produção foi abençoada em missa dedicada ao ofertório. Para além da colheita, os moradores ofereceram a rica e longeva tradição cultural que sobrevive na comunidade, como demonstra o emocionante grupo que, a certa altura, ergue um de seus meninos e canta a importância da solidariedade na vida da comunidade: “[…] de onde nós vem? Nós é do quilombo, é negro por negro”, expressão que dá nome ao grupo. O evento se encerrou com a apresentação das crianças e jovens que participam do projeto de iniciação musical em percussão, desenvolvido pelo Inhotim, tendo à frente o músico Rei Batuque – também um quilombola – em uma demonstração do conhecimento e profundo respeito que o Instituto tem pelas manifestações culturais presentes no território que o abriga.

Foto: Daniela Paoliello
Integrantes do grupo de percussão do Inhotim se apresentam na Festa da Colheita. Foto: Daniela Paoliello