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Outro olhar sobre a história da arte

Redação Inhotim

Desde 27 de junho, o Rio de Janeiro tornou-se palco da maior exposição internacional que a cidade já viu. Organizada pelos curadores Rodrigo Moura, diretor de arte e programas culturais do Inhotim, e Adriano Pedrosa, a mostra artevida pretende contar a história da arte a partir de referências que fogem dos grandes centros culturais. São cerca de 300 obras de 110 artistas da América do Sul, Leste Europeu, Oriente Médio, África e Ásia. Alguns deles, como os brasileiros Lygia Pape, Hélio Oiticica e Cildo Meireles, também podem ser vistos no Inhotim.

 

O título da mostra não foi escolhido por acaso. Para o movimento neoconcretista, surgido no Rio de Janeiro dos anos 1950, a arte deveria estabelecer diálogos e tensões com aspectos da vida e do mundo. Essa postura foi fundamental para a formação da arte contemporânea brasileira. A exposição, em cartaz na Casa França-Brasil, na Biblioteca Parque Estadual e no Parque Lage, se estende também para o MAM Rio, a partir do próximo sábado, 19 de julho, com a abertura de seu segundo segmento. O Blog do Inhotim conversou com os curadores da artevida, que contaram um pouco mais sobre o projeto. Leia a seguir!

 

Blog do Inhotim – A exposição reúne artistas de países do Sul global para oferecer outro olhar sobre a história da arte. Como esse recorte foi pensado?

Adriano Pedrosa e Rodrigo Moura –A pesquisa em relação aos artistas já vem de vários anos. Estrangeiros ou brasileiros, muitos são profissionais com quem já trabalhamos. Os conjuntos e subconjuntos de obras foram eleitos a partir do conhecimento e da reflexão sobre esses trabalhos, mas pensando, sobretudo, em perspectivas brasileiras. Assim, na seção artevida (corpo), na Casa França-Brasil, surgem núcleos de obras brasileiras e estrangeiras a partir do Bicho, da Linha orgânica (ambos de Lygia Clark), do Tecelar (de Lygia Pape), do Parangolé (de Hélio Oiticica), gerando aproximações que revisam a abstração geométrica ortodoxa, sugerem uma forma orgânica e corporal de pensar o objeto e põem em relevo o corpo como ativador da experiência artística. Já na seção artevida (política), os núcleos temáticos são relacionados à ditadura, guerra, violência, eleições, censura, manifestações, trabalho, feminismos, racismo e buscam esse paralelo entre contextos aparentemente desconectados, mas que guardam alguma relação com o brasileiro.

 

BI – Como as obras escolhidas se relacionam às narrativas hegemônicas da arte contemporânea?

AP e RM – A exposição olha para a produção brasileira como matriz e filtro para pensar outras relações mais amplas, globais, entre diferentes contextos artísticos. Priorizamos esse diálogo com polos de produção que estão, de certa maneira, mais próximos de nós, por dividirmos uma história colonial e pós-colonial, ou uma história recente de regimes autoritários, ou, simplesmente, por estarem longe dos centros hegemônicos de produção. Há o desejo de desarmar um modelo de filiação que sempre passa pelo centro para legitimar sua produção. Não quer dizer que negamos nossas relações com a Europa Ocidental e os Estados Unidos, de forma alguma. Há, inclusive, artistas dessas regiões na exposição, mas, o que estamos propondo, são novos diálogos, que ainda estão por ser feitos. Se na primeira parte, que inauguramos na Casa França-Brasil no último mês, esse diálogo se dá mais pelo corpo, seja pela geometria, seja pelo autorretrato, na seção que será inaugurada no próximo sábado, no MAM Rio, ele se dá mais pela política. Isso não quer dizer uma evolução no tempo, mas uma diferença, uma modulação no enquadramento da curadoria.

 

BI – Alguns nomes da mostra estão presentes no acervo do Inhotim, como Hélio Oiticica, Geta Bratescu e Hitoshi Nomura. Como a coleção do Instituto dialoga com essa proposta de ver a história da arte por outro ângulo?

RM – De maneira muito importante, me parece. Como dizemos no statement curatorial da artevida, essa não é a exposição de uma tese, mas de muitas hipóteses. Essa representação polifônica é algo que aprendi na lida com a formação de acervo, em que isso acontece o tempo todo. No Inhotim, os artistas que você menciona tem um lugar importante, justamente porque encontram solo tão fértil no sentido dos diálogos com artistas brasileiros que são centrais na construção da narrativa do que o Inhotim significa como arte: Lygia Pape, Cildo Meireles e Hélio Oiticica, por exemplo, representados com obras tão importantes no nosso acervo. No Inhotim, recentemente fizemos alguns aprofundamentos em áreas que conhecíamos apenas superficialmente, como Leste Europeu e Japão, que ainda não foram inteiramente revelados, mas que começam a aparecer em exposições do Instituto. É o caso da mostra individual da romena Geta Bratescu, na Galeria Lago a partir de setembro, e Do Objeto ao Mundo – Coleção Inhotim, no Palácio das Artes em dezembro e no Itáu Cultural no ano que vem, quando vamos mostrar bastante material japonês que encontra grande ressonância com a arte produzida no Brasil no mesmo período.

 

Ficou interessado? Então se programe! A artevida fica em exibição até 21 de setembro de 2014.

Rodrigo Moura e Adriano Pedrosa
Rodrigo Moura (esq.) e Adriano Pedrosa (dir.) no Parque Lage, onde acontece parte da exposição. Foto: Leo Aversa

Another look towards art history

Redação Inhotim

Since June 27, Rio de Janeiro has witnessed the greatest international exhibit the city has ever seen. Organized by curators Rodrigo Moura, director of art and cultural programs at Inhotim, and Adriano Pedrosa, the artevida exhibit [literally, art&life] aims to tell the history of art based on references not found in major cultural centers. The exhibit features about 300 works of art by 110 artists from South America, Western Europe, the Middle East, Africa and Asia. Some of them, such as Brazilian artists Lygia Pape, Hélio Oiticica and Cildo Meireles, can also be seen at Inhotim.

 

The name of the exhibit was not chosen by chance. For the neoconcretist movement that first appeared in Rio de Janeiro in the 1950s, art should establish dialogs and tensions related to aspects of life and of the world. This attitude was essential to form Brazilian contemporary art. On display at Casa França-Brasil, Parque Estadual Library and Parque Lage, the exhibit also expands to MAM Rio (Museum of Modern Art), starting this coming Saturday, July 19, with the opening of its second segment. Inhotim’s Blog talked to artevida curators, who told us a little bit more about the project. Read more below!

 

Inhotim’s Blog – The exhibit gathers countries in the Southern Hemisphere to offer another look towards the history of art. How did this idea come about?

Adriano Pedrosa and Rodrigo Moura – The research regarding the artists has been happening throughout the past several years. Many of the foreign and Brazilian artists are professionals we have worked with before. The sets and subsets of works were chosen based on knowledge and reflection on these works, but, above all, considering Brazilian perspectives. Thus, the section artevida (body), at Casa França-Brasil, has clusters of Brazilian and foreign works based on Bicho, Linha orgânica (both by Lygia Clark), on Tecelar (by Lygia Clark), on Parangolé (by Hélio Oiticica), generating close relationships that revisit the orthodox geometric abstraction, suggesting an organic and body-conscious form of thinking about the object and emphasizing the body as an activator of the artistic experience. On the other hand, in the section artevida (politics), thematic clusters are related to dictatorship regimes, war, violence, elections, censorship, demonstrations, work, feminism, racism, and seek this parallel between contexts which apparently are not connected, but that bear some kind of relationship with the Brazilian people.

 

IB – How do the works chosen relate to hegemonic narratives in contemporary art?

AP and RM – The exhibit looks towards the Brazilian production as a matrix and filter, so as to consider broader, more global relationships between different artistic contexts. We have prioritized this dialog with production hubs which are somehow closer to us, either because they share with us a colonial and post-colonial history, or recent history of authoritarian regimes, or, simply, because they are far from hegemonic production centers. There is a desire to untie an affiliation model that always goes through the center so that production can be legitimized. This doesn’t mean we deny our relationship with Eastern Europe and the United States at all.Actually, there are some artists from these regions present in the exhibit. What we propose are new dialogs, which have not yet taken place. If, in the first part, which we opened at Casa França-Brasil last month, this dialog happens by way of the body, whether through geometry or self-portraits, in the section that opens next Saturday at MAM Rio, this dialog happens through politics. This doesn’t mean an evolution in time, but rather a difference, a modulation of the curatorial framework.

IB – Some of the names featured in the exhibit are present in Inhotim’s collection, such as Hélio Oiticica, Geta Bratescu and Hitoshi Nomura. How does the Institute’s collection dialog with this proposal to see art history from another angle?

RM – It seems to me, this dialog happens in a very important way. As we mention in artevida’s curatorial statement, this is not an exhibit of a thesis, but of many hypotheses. This polyphonic representation is something I learned working in the formation of the collection, when this happens all the time. The artists you’ve mentioned have a very important place at Inhotim, precisely because they found such fertile soil when it comes to dialogs with Brazilian artists, they are central to building a narrative of what Inhotim represents as art: Lygia Pape, Cildo Meireles and Hélio Oiticica, for instance, are represented with such important works in our collection. At Inhotim, we’ve recently delved into areas we just knew superficially before, such as Western Europe and Japan, which have not yet been completely revealed, but that start to appear in exhibits at the Institute. This is the case of the individual exhibit by Romanian artist Geta Bratescu, at Galeria Lago as of September, and Do Objeto ao Mundo – Coleção Inhotim, at Palácio das Artes in December and at Itáu Cultural next year. In these exhibits, we are going to show quite a lot of Japanese material that have great resonance with the art produced in Brazil in the same period.

 

Interested? Then plan to visit artevida!The exhibit will be open until September 21, 2014.

Rodrigo Moura e Adriano Pedrosa
Rodrigo Moura (left) and Adriano Pedrosa (right) at Parque Lage, where part of the exhibition takes place. Photo: Leo Aversa